A instalação do Complexo Hidrelétrico Renace, localizado na bacia do rio Cahabón (na região de Alta Verapaz na Guatemala), um projeto hidrelétrico iniciado nos anos 90, promovida por uma empresa guatemalteca, a Corporación Multi-Inversiones que pertence ao grupo empresarial espanhol COBRA (ACS), está impactando os direitos humanos das comunidades indígenas presentes no território e também o meio ambiente. Contrariamente o que está acontece na região não corresponde à imagem de sustentabilidade ambiental e social que as empresas envolvidas, tanto as nacionais como as estrangeiras, e mais especificamente espanholas, veiculam na mídia do país centro-americano.
No total, estima-se que cerca de 30 quilômetros do rio Cahabón deverá ser afetado pela instalação do Complexo, e consequentemente uma população de 29.000 indígenas da etnia Quekchí também serão impactados. Como outros povos indígenas, os Quekchí têm sido historicamente submetidos a conflitos com proprietários de terras e sofreram discriminação por parte da população mestiça, alguns dos agravantes dessa marginalização é que a maioria vive dispersa em 450 comunidades rurais remotas com má comunicação com o restante da região e muitos não falam espanhol ou o entendem com dificuldade.
É relevante ainda saber que Alta Verapaz foi uma das áreas mais atingidas pelo genocídio indígena durante o conflito na Guatemala (1960-96), o que deixou um legado de medo em toda a área, especialmente em Cahabón, onde houve uma grande repressão.
Segundo pesquisas, da entidade Alianza por la Solidaridad, nesse processo de construção estão ocorrendo graves violações de direitos e impactos ambientais,
bem como o aumento dos conflitos dentro das comunidades da região, reclamações e criminalização dos que se opõem ao projeto. Ademais, a Entidade denuncia que não houve a realização da consulta prévia e informada com as comunidades indígenas afetadas pelo projeto, como é exigido pela convenção 169 da OIT.
O Punto Nacional de Contacto (NCP) do Ministério da Indústria, Comércio e Turismo da Guatemala, órgão colegiado interministerial responsável pela promoção do cumprimento dos direitos humanos pelas multinacionais de acordo com as diretrizes da OCDE, afirma em um relatório que a empresa espanhola Grupo Cobra (ACS) não agiu adequadamente no caso das obras hidrelétricas da RENACE no País, mencionando em seu relatório expressamente a necessidade a corresponsabilidade à luz da devida diligência exigida tanto da empresa espanhola, financiadora, e a empresa guatemalteca, empreiteira do projeto:
“A empresa espanhola que é objeto da reclamação é lembrada que as Diretrizes da OCDE para Empresas Multinacionais são muito exigentes em termos de due diligence, de tal forma que a posição de contratante não dispensa a empresa espanhola de cumprir com os mais altos padrões internacionais, além do mero cumprimento da lei no país de destino. Além disso, tem o dever de exigir que o parceiro local os cumpra e de instá-lo a cumpri-los caso seja detectado um descumprimento”.
A Corporación Multi Inversiones (CMI) pertence à família Gutiérrez-Bosch, uma das famílias mais importantes da elite guatemalteca. A empresa hoje tem cerca de 30.000 funcionários e opera em 16 países, e a sua expansão internacional que tem sido fomentada pelos herdeiros do patriarca da família, que era de origem espanhola.
A CMI é proprietária da conhecida cadeia Pollos Campero, já sendo um conglomerado presente na indústria pecuária. A entrada da CMI no setor de energia começou na década de 1990, coincidindo com a reviravolta energética que teve na Guatemala com o início de uma série de privatizações do patrimônio público do Estado.
O Grupo Cobra é uma empresa espanhola especializada em engenharia industrial, infra-estruturas de energia renovável (hidro, eólica, solar, etc.), redes e infraestruturas, e sistemas de tecnologia e comunicação. Na construção de mini hidroelétricas e plantas de médio porte, tem ampla experiência internacional, especialmente na América Central. A empresa é uma subsidiária do Grupo ACS, que tem sede em Madrid na Espanha, e que de acordo com o ranking Engineering News-Record Top Lists – ENR, a ACS (com mais de 210.000 funcionários e presença em mais de 80 países) é a maior empresa de construção dos Estados Unidos e da Austrália, a segunda maior da América e a segunda maior da Europa.
O Grupo ACS é presidido por Florentino Pérez, um homem de negócios bem conhecido mundialmente porque, além disso, é também o presidente do Real Madrid Football Club.